- Nº 2252 (2017/01/26)
Contra o desemprego, a exploração
e a precariedade

Uma batalha<br>de todos os dias

Temas

Se fazes falta todos os dias por que razão o teu contrato é precário?
Este é um dos motes da segunda fase da campanha «Mais Direitos, Mais Futuro. Não à precariedade» levada a cabo pelo PCP.

A resposta a esta pergunta, sendo simples, está transformada num dilema para milhares de trabalhadores. Do que falamos quando tratamos o flagelo do precariedade? Falamos necessariamente dos vínculos laborais, mas essa é talvez a mais visível consequência mas nem por isso a mais dramática.

A precariedade dos vínculos é a precariedade do salário, dos direitos, é a precariedade da vida.

Calcula-se que cerca de um milhão e duzentos mil trabalhadores trabalham em situação precária o que significa que todos os que o rodeiam, suas famílias e os que lhes estão mais próximos constituem o enorme exército de vidas suspensas, intermitentes em permanente insegurança e incerteza sobre o dia seguinte.

Milhares de trabalhadores nesta situação, qual o significado na vida de cada um, quais as consequências sociais e económicas para um País em que um terço da sua força de trabalho tem relações laborais precárias, aufere baixos salários, tem horários profundamente desregulados e na maioria das vezes não vê os seus direitos respeitados?

Um País nestas circunstâncias é um País que todos os dias põe em causa o seu presente e compromete o seu futuro.

A precariedade laboral é um flagelo e um drama social e económico ao qual o Estado tem a obrigação e a urgência de dar combate.

A quem serve a precariedade laboral?

A precariedade laboral servirá aos mais de duzentos mil falsos prestadores de serviços e falsos recibos verdes, trabalhadores que cumprem um horário determinado, respondem perante uma chefia e executam todos os dias tarefas no mesmo local de trabalho?

Servirá a precariedade laboral aos cerca de oitenta mil trabalhadores temporários que passam em muitos casos anos consecutivos a desempenhar a mesma tarefa e no mesmo local de trabalho, sem nunca terem vínculo à empresa para a qual realmente trabalham e vão sistematicamente rodando entre empresas de trabalho temporário que lhes ficam com uma parte significativa do valor do seu trabalho?

Servirá a precariedade aos 66 por cento dos jovens trabalhadores menores de 25 anos que estão nesta situação laboral ou ao grupo etário com 45 e mais anos onde a percentagem tem vindo a aumentar atingindo hoje já perto dos 13 por cento?

Servirá a actual situação aos cerca de 800 mil trabalhadores com contratos a prazo, que no fundamental desempenham tarefas que todos os dias fazem falta e cujas necessidades se mantêm de forma permanente?

Servirá a precariedade aos trabalhadores a tempo parcial que representam já hoje 53 por cento do total dos vínculos precários existentes e onde muitas das vezes a única coisa que é parcial é o salário que ganham?

Servirá a actual situação aos mais de cem mil trabalhadores que através dos contratos de inserção, estágios, falsas bolsas e outros expedientes ocupam na sua larga maioria dos casos necessidades permanentes na administração pública e na chamada economia social?

É evidente que não.

Então se a precariedade não serve aos trabalhadores nem ao País, a quem serve?

Serve aos poucos que se alimentam da exploração, insegurança e instabilidade de muitos. Dessa forma serve que nem uma luva aos que pagam aos trabalhadores com vínculos não permanentes menos 30 a 40 por cento do que aos trabalhadores com vínculo efectivo.

Serve aos poucos que se alimentam da chantagem e do cutelo do desemprego como forma de pressão constante sobre os direitos, sabendo que os trabalhadores com vínculo precário são os que têm maior risco de desemprego, sendo a não renovação dos contratos a primeira causa registada de desemprego.

Serve aos poucos que enriquecem à custa da pobreza de muitos, sabendo que quanto maior for a precariedade laboral maior é o risco de pobreza mesmo para aqueles que trabalhando todos os dias não conseguem obter rendimento suficiente para saírem dessa situação, que em 2014 afectava 13,3 por cento dos trabalhadores em situação de precariedade.

Serve aos poucos que encontram todos os expedientes possíveis para justificar o recurso a contratos não permanentes, como se as necessidades assim o exigissem, tal como se verificou em Novembro de 2016, em que 87 por cento das ofertas registadas (sendo que entre as ofertas com origem em empresas de trabalho temporário a percentagem subia para os 99 por cento) se destinavam a contratos de trabalho a termo.

Serve aos poucos que fomentam a divisão entre os trabalhadores, procurando catalogá-los entre precários e não precários de forma a ir retirando direitos a uns para depois retirar direitos a outros.

Está tudo ligado

Desemprego, exploração, precariedade. Está tudo ligado.

É preciso, é urgente e é possível acabar com este flagelo individual, este drama social, este obstáculo ao desenvolvimento do País.

A um posto de trabalho permanente, um contrato efectivo e permanente de trabalho.

Por iniciativa e acção do PCP foi possível dar passos, ainda que limitados, no Orçamento do Estado 2017, com vista ao combate à precariedade no âmbito da administração pública. Medidas que, sendo positivas, não resolvem por si só os problemas existentes. É necessário continuar e intensificar a luta para que trabalhadores que estão em situação de contrato precário passem à condição de contrato permanente.

Os passos dados no âmbito da administração pública são importantes e devem constituir exemplo para todos os sectores no sentido da concretização de uma política de efectivo combate à precariedade e de defesa dos direitos dos trabalhadores, tal como propõe o PCP. Uma política do interesse e ao serviços dos trabalhadores, opções que não se compadecem com caminhos de contrapartidas ao patronato, opções que rompam com o caminho de roubo de direitos e que tenham como elementos centrais: a adopção do plano nacional de combate à precariedade laboral e à contratação ilegal como uma política de Estado, a única de forma de fazer frente a este drama social.

Opções de fundo que não dispensam, antes exigem a revogação das normas mais gravosas do Código do Trabalho; reposição da não caducidade da contratação colectiva e do tratamento mais favorável; fim da utilização dos contratos de inserção, estágios, falsas bolsas, para o suprimento de necessidades permanentes; erradicação dos «falsos recibos verdes», assim como as necessárias alterações fiscais para trabalhadores independentes; combate ao trabalho não declarado, contratação ilegal e tráfico de mão-de-obra; fim do uso ilegal e abusivo dos contratos a prazo e tempo parcial; reforço dos meios e capacidade interventiva da autoridade para as condições de trabalho e o combate decisivo à chaga do trabalho temporário.

Esta é uma batalha que todos os dias está a ser travada nas empresas e locais de trabalho, uma batalha onde de um lado estão uns poucos que com todos os seus meios e instrumentos são os que ganham com a exploração, o desemprego e precariedade; do outro lado estão os trabalhadores, o seu Partido – o PCP – e o movimento sindical de classe e acima de tudo a sua força imensa que organizada consegue todos os dias fazer frente a este drama social com vitórias que muitas vezes sendo pontuais são de uma enorme importância.

É nas mãos dos trabalhadores, na sua unidade, organização e luta que reside o único caminho para levar por diante «Mais direitos, Mais Futuro. Não à precariedade» e para que a um posto de trabalho permanente corresponda um vínculo efectivo.

 

Paulo Raimundo